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Movementos sociais, Politica internacional — 8 Outubro, 2023 at 6:48 p.m.

O direito do povo palestino a resistir

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Após 76 anos de colonialismo, genocídio e limpeza étnica, os palestinos fazem valer seu direito à autodefesa, reagindo às políticas de extermínio sionistas. Quando ele se vira e se recusa a morrer em silêncio, recebe mais um silêncio hipócrita dacomunidade internacional.  Porém, nem Palestina  pode ser reduzida a “Hamas”, nem os colonos israelitas convertidos em simples “cidadãos israelitas” e nem estes em sionistas. A extrema direita abertamente racista de Israel está sendo cada vez mais reconhecida como legítima e tornando-se parte do discurso político público da União Europeia enquanto a “esquerda” israelense está desaparecendo rapidamente. Silêncio internacional flagrante que demonstra o fracasso das Nações Unidas e os padrões duplos com que moitos países do mundo, especialmente aqueles na órbita dos EUA, entendem os direitos humanos.Vamos fingir que Israel não comete crimes?A Europa não pode permitir que isso aconteça, e certamente não pode ser cúmplice de um criminoso de guerra que procura uma vitória abrangente e definitiva, não contra um grupo, mas contra todo um povo.

Durante o último derramamento de sangue, a única caraterística distintiva do conflito – a colonização ilegal e contínua das terras árabes ocupadas – foi mais uma vez um assunto tabu, a ser ignorado ou mencionado de passagem apenas quando os colonos judeus eram mortos.O apoio indissolúvel dos Estados Unidos é por vezes esquecido, algo completamente alheio à brutalidade do povo, polo que é necessário recordar que faz parte da política dos EUA. guerra ao terrorismo desde 2001.

Gaza continua a ser a maior prisão a céu aberto do mundo. Há um ano, o bombardeamento indiscriminado de Israel na Faixa de Gaza foi transmitido em directo nas redes sociais e nenhum meio de comunicação mainstream, nem qualquer representante político, lhe deu a oportunidade de denunciar a situação da população civil palestina.O silêncio internacional é flagrante face às contínuas violações dos direitos humanos, apesar das contínuas resoluções da ONU, um caso único no mundo.

Israel ocupou a Cisjordânia (anteriormente governada pola Jordânia) e a Faixa de Gaza (governada polo Egipto). Ainda nem meio ano depois da guerra, o Conselho de Segurança da ONU adoptou a Resolução 242, exigindo a retirada de Israel de todos os territórios ocupados. Durante os últimos 56 anos, milhões de palestinos nativos da Cisjordânia e da Faixa de Gaza viveram sob o domínio militar israelita. Uma ocupação que durou mais de meio século, uma das mais longas da história moderna e com vários milhares de soldados estacionados nesses territórios para a manter.
Os territórios ocupados têm tido duas populações distintas: os palestinos locais e os colonos que são compatriotas da força de ocupação militar.Só estes últimos estão sujeitos à lei que se aplica no seu próprio país, Israel. Participação em eleições e usufruto de práticas democráticas. Por outro lado, a população ocupada terá de respeitar as leis estabelecidas polo comandante militar que é também o legislador do território ocupado.O que ele decreta torna-se lei. Por exemplo, através da criação de tribunais militares com um representante do Shabak (ou Shin Bet, Serviço de Inteligência) que fazia um depoimento de braço dado do coronel que presidia que, como um inquisidor, conduzia ao resultado esperado e sempre direcionado ( “o acusado é um risco de segurança”) e que decidiam numa só audiência sem possibilidade de confirmar ou verificar as informações e sem as garantias legais de um verdadeiro processo judicial, como sabemos polos testemunhos dos soldados que conduziram a ocupação colonialista e pola lógica subjacente a estas práticas (ver o documentário “Os primeiros 54 anos. Um Breve Manual para uma Ocupação Militar” de Avi Mograbi.)

Depois de limpar etnicamente mais de 400 cidades palestinianas em 1948, Israel bombardeou os residentes de Asqalun – hoje Ashkelon – e levou-os ao exílio em Gaza. Em seguida, colocou judeus do Iraque, do Iêmen e, mais tarde, da Rússia, em suas casas. A crise atual não começou com os foguetes de Gaza, mas em Jerusalém Oriental, onde Israel tenta mais uma vez expulsar as famílias palestinianas. A frustração dos palestinos é facilmente compreensível já que desde a guerra de 1967 que estão presos numa espécie de limbo na Cisjordânia, sem identidade, como refugiados na sua própria terra.

 

A responsabilidade israelense no surgimento do “fundamentalismo islâmico”

Vai caminho a criaçao de Hamas e não se referem a qualquer tipo de “terrorismo islâmico”. Nos anos 70, o xeque palestiniano Ahmed Yassin, fundou uma organização baseada no fundamentalismo islâmico, que foi inicialmente vista com bons olhos por Israel, que acreditava que enfraqueceria a Al Fatah, a principal organização da OLP (Organização para a Libertação da Palestina).Nos anos 80, quando Arafat era o “super-terrorista” e o Hamas era uma pequena e simpática instituição de caridade muçulmana, embora venenosa na sua oposição a Israel, o governo israelita encorajou os seus membros a construir mesquitas em Gaza, di Robert Fisk (The Independent, Londres, 5 de dezembro de 2001)

Em 1978, o Egipto e Israel assinaram um tratado de paz que previa a autonomia palestiniana na Cisjordânia e em Gaza, mas as negociações tripartidas sobre o futuro dos palestinos, sob a liderança dos EUA, nunca resultaram num acordo, porque foram sendo construídos cada vez mais assentamentos. Não é novidade descobrir agora que critérios diferentes são aplicados polos estados e potencias coloniais a situações semelhantes desde sempre (não apenas porque hoje os ucranianos têm o direito de se defenderem e os palestinos não) sob a lógica imperialista que leva as potências ocupantes a agir segundo os interesses de potências ainda mais poderosas mesmo quando é mais caro ficar do que retirar-se. Em 1987, foram criadas 120 colónias com uma população de 50.000 colonos.Mas, 20 anos depois, foi também o momento em que Israel percebeu que tinha perdido o controlo total da enorme empresa de conquista e ocupação de territórios. No final de 1987, a violência dos militares e dos colonos contra os habitantes das aldeias palestinianas e o aumento do número de mortes e a repetida negação do direito à autodeterminação levou à eclosão da Primeira Intifada. Uma revolta civil não armada que mobilizou uma parte significativa da população palestiniana dos territórios ocupados. Durante a Intifada, estima-se que um em cada cinco palestinos ocupados foi detido por várias razões sem motivo (não é brincadeira, não ter pago a conta da eletricidade ou ter vencido o seguro do carro, destruir uma aldeia inteira ou a casa de alguém ou  deixá-lo amarrado ao sol) e mantido por períodos de tempo curtos ou longos.Porque podiam.

Na esteira da revolução iraniana, Ahmed Yassin criou a Majd al Mujaidin [“Glória dos Combatentes do Islã”] sendo detido em 1984 polo Shin Bet  por terrorismo anti-israelense. Ficou um ano preso, libertado por uma troca de prisioneiros. Em dezembro de 1987, Ahmed Yassin fundou o “Movimento de Resistência Islâmica”, que deu origem ao Hamas.Mai uma vez preso em 1989, Ahmed Yassin foi libertado em outubro de 1997 por ordem do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e exilado para a Jordânia, graças à intervenção do rei Hussein, que prestava discreto apoio ao Hamas.Robert Fisk  sublinhou a responsabilidade israelense no surgimento do “fundamentalismo islâmico”. E acrescenta Fisk: “Mesmo depois do acordo de Oslo, durante uma desavença com Arafat, altos oficiais do exército israelense anunciaram publicamente que estavam conversando com funcionários do Hamas. E quando Israel ilegalmente deportou centenas de homens do Hamas para o Líbano em 1992, foi um de seus líderes, escutando que eu viajava para Israel, que me ofereceu o telefone da casa de Shimon Peres de sua agenda”.

 

Uma lógica do vazio

Israel assinou os Acordos de Oslo com a OLP em 1993 e retirou as suas forças dos centros urbanos palestinos.O líder Arafat regressou à sua terra natal e criou a Autoridade Nacional Palestiniana, que passou a governar a maioria da população palestiniana nos territórios ocupados, conduzindo a um período de relativa calma.Os Acordos de Oslo dividiram Gaza e a Cisjordânia em zonas de domínio distintas.Enquanto o exército israelita continuava a controlar as zonas adjacentes à Cisjordânia, onde o movimento era constante, as áreas atribuídas aa Autoridade Nacional Palestiniana incluindo cidades e 160 enclaves não ligados entre si, limitavam severamente a circulação dos palestinos.Surge um novo dispositivo de vigilância baseado nos controlos na estrada, postos de controlo e autorizações de acesso difíceis de obter. O desencanto e o descontentamento em relação ao que os seus líderes tinham conseguido aumentar a frustração dos palestinos.

Quem hoje age como um Estado fundamentalista religioso é o estado de Israel, com o propósito de destruir a mesquita de al-Aqsa e substituí-la por um novo templo, como o que existia antes de ser destruído polos romanos e reocupar o Monte Sinai. Um estado que detenta a “judaicidade exclusiva” mas que ignora  e mesmo reprime os inúmeros judeus que apoiam o BoycottDivestmentSanctions ( movimento que trabalha para acabar com o apoio internacional à opressão de Israel sobre os palestinos) e moitos que têm dúvidas sobre a política do Estado de Israel na Cisjordânia

Uma série de mais de vinte atentados bombistas suicidas abalou Israel na segunda metade da década de 1990, levando Israel a impor medidas ainda mais repressivas contra os palestinos ocupados, tais como o recolher obrigatório regular e o aumento das restrições à circulação.O substituto da autodeterminação é a miragem de um autogoverno concedido, dependente da vontade do verdadeiro poder governamental é quem finalmente instiga a revolta e a nova insurreição armada e sangrenta.O primeiro ano do século XXI, treze anos após a Primeira Intifada, a frustração de ver os Acordos de Oslo num impasse e a impotência e o ressentimento face às crescentes restrições, ajudou os palestinos a perceberem que Israel não lhes permitiria criar um Estado independente e que os assentamentos não se moveriam um milímetro intactos, o que levou a uma nova revolta.A Segunda Intifada foi armada e sangrenta.A expressão mais dura dos novos ataques suicidas palestinos foram os centros civis israelitas. Os anos de apartheid produziram palestinos dispostos a sacrificar as suas vidas para se livrarem daqueles que, aos seus olhos, eram responsáveis ​​por lhes negar a liberdade.Uma resposta de defesa desesperada para a qual Israel não teve resposta militar. Porém, a reação foi cruel e sangrenta.Nos cinco anos seguintes, mais de quatro mil pessoas perderam a vida durante a Segunda Intifada (950 israelitas i 2300 palestinos). Qualquer membro da população ocupada, mesmo que ele seja inocente, torna-se uma ameaça contra o governo israelita. Uma pessoa dos territórios ocupados é uma bomba que  deve ser desativada. Portanto, trata-se de impedir que qualquer pessoa chegue a qualquer lugar. No território ocupado são delimitadas áreas de demarcação que proíbem a circulação dos habitantes ocupados e traçam e levantam barreiras impenetráveis. Estradas separadas para árabes e judeus após trabalhos de demolição em ambos os lados de casas, árvores froiteiras e plantações. Mas, na prática, as estradas permitidas por lei para os palestinos os militares tiveram de garantir que não eram utilizadas porque todos eram suspeitos polo simples facto de tentarem fazê-lo. Evidentemente, gerou diversas formas de resistência local.

Na guerra, como na guerra, todo mundo é um inimigo

Em 2002, teve início a construção de uma barreira de separação na Cisjordânia composta por oito metros de muro de concreto e um complexo conjunto de cercas com um sofisticado sistema de vigilância, vendida como forma de prevenir ataques terroristas que na prática isolaram 10% da Cisjordânia dos seus habitantes palestinos. Uma separação radical  dos agricultores das suas terras, os estudantes das escolas e o resto dos trabalhadores dos seus empregos

A demolição de casas de assentamentos judaicos na Faixa de Gaza, a transferência dos colonos para Israel e o regresso das suas tropas à fronteira internacional, no entanto, deixou intactos os assentamentos de meio milhão de colonos na Cisjordânia. Após a retirada, os residentes palestinos em Gaza votaram no movimento religioso radical Hamas para governar a Faixa. Em 2007, Israel e o Egipto impuseram um bloqueio a Gaza. Os ataques do Hamas contra israelitas em torno de Gaza levaram Israel a fazer incursões na Faixa, intensificando claramente o combate. Na guerra, como na guerra e sem consideração polos transeuntes inocentes. Está sendo estabelecida uma destruição intencional e sistemática da área. Com unidades especiais de engenharia, casas são demolidas com escavadeiras, tanques, morteiros, artilharia e helicópteros.

Quando uma potência inimiga invade um território e a população invadida pega em armas chama-se “resistência”, quando uma potência amiga que invade e a população se rebela chama-se “terrorismo”.E por que somos “terroristas”? O colonizadonão tem direito de reagir à violência do colonizador? Essa narrativa será sustentada até que não reste um só palestino na Palestina?

 

Quem hoje age como um Estado fundamentalista religioso é o estado de Israel, com o propósito de destruir a mesquita de al-Aqsa e substituí-la por um novo templo, como o que existia antes de ser destruído polos romanos e reocupar o Monte Sinai. Um estado que detenta a “judaicidade exclusiva” mas que ignora  e mesmo reprime os inúmeros judeus que apoiam o BoycottDivestmentSanctions ( movimento que trabalha para acabar com o apoio internacional à opressão de Israel sobre os palestinos) e moitos que têm dúvidas sobre a política do Estado de Israel na Cisjordânia.

O campo que se configurou no mapa político israelense nos últimos 25 anos é o da direita e da extrema direita. O que é chamado de esquerda liberal, na sociedade israelita, foi progressivamente eliminado e substituído por este quadro ideológico que domina a política israelita. . Nas últimas eleições em Israel vimos como quase todo o arco parlamentar do Knesset são forças de direita ou de extrema-direita, algo que não parece fazer soar o alarme na Europa. De facto, a “esquerda” israelense está desaparecendo rapidamente e a liderança israelense agora está dividida entre uma direita pragmática e uma extrema direita, ambas rejeitando as negociações políticas e o estado palestino.

A grande dúvida que se levanta, como em 2021, é se esta nova crise está a servir mais uma vez os interesses de Netanyahu, quer dizer, a ação que precisava (instrumentalizando o exercício da legítima auto-defesa do povo palestino!) para transformar um protesto verdadeiro e desesperado contra a limpeza étnica israelita na Cisjordânia em mais um conflito entre Israel e o Hamas, no qual Israel já não se limitaria a responder aos ataques de rockets (embora o próprio Netanyahu tenha agora de admitir que a agitação civil em Israel é uma ameaça maior do que os rockets de Gaza) mas declarar guerra total em paralelo á  desintegração do estado de dereito em Israel nomeadamente  para os seus cidadãos palestinos, abandonados à própria sorte e impossibilitados de recorrer a nenhuma agência  ou instância superior.

Os palestinos têm o direito de resistir à agressão ininterrupta a que estão sendo submetidos. Quando uma potência inimiga invade um território e a população invadida pega em armas chama-se “resistência”, quando uma potência amiga que invade e a população se rebela chama-se “terrorismo”. Não há equivalência moral, política ou militar entre os dous lados. Porém,uma paz justa é o único sucesso na defesa do povo palestino e judeu reféns de políticos e diplomatas que assumem o fervor guerreiro e fogem da palavra paz.

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