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Confinamento não é postergação

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Eureka Street; 3/8/2020, Vol. 30 Issue 5, p1-4, 4p, 1 Color Photograph.RMIT University, Melbourne

As tentações autoritárias já são suficientemente fortes para ter a saúde como um pretexto. Ja há quem propôs  ferramentas de control para quando o confinamento terminar, como a criação de um documento de identificação viral que permita provar se estamos infectados ou não, se somos bons ou maus operários, se submetemos convenientemente ás informações para nossa salvação. Pensamento efectivo cujas boas intenções ninguém duvida, mas que abriga um cerne delirante do qual se pode dizer que já sabemos tudo isso, mas não sei ao certo o que deriva disso, pois acostumamos a identificarmos sem muita reflexão a política do Estado com gestão econômica e porque acabamos sendo tão viciados ao ordem que não vemos na insurreição mais do que o risco de desunião, não porque as leis não valem nada, mas porque existe um bem público e uma força soberana que transcende os estados.

Após a des-localização, agora chega geo-localização por telefone celular para obter informações – por exemplo, de contato e relacionamento recente entre pessoas. Google mostrou-nos mais unha vez como a  geolocalização pelo telefone celular – por exemplo, nossos movimentos de casa para o trabalho ou para um local de lazer permitem rastrear e mapear o grau de confinamento de todos nós pela ordem de alarme decretada pelo governo espanhol. As tecnologias fornecedores do seu material construtivo: a informação. Têm vindo a ser praticadas com baixa intensidade  em todos nós com a nossa complacência de consumidores satisfeitos e que foram tentadas agora, parece que efetivamente, em alguns lugares da Ásia para erradicar o coronavirus.  Todo o que foi mobilizado em nome do nosso conforto e eficiência, permite agora organizar confinamentos territoriais parciais ou pessoais em termos de erradicação de vírus porque foi legitimada pela ciência  e o estado protector. Aceitamos  a restrição temporária  mais séria das liberdades básicas  por causa do medo e por uma narrativa de auto-proteção. Todo bem. Mas não devemos ter pressa de confundir o bem público com o Estado e suas prerrogativas de control.

Certamente, o bem-estar humano, a qualidade e a eficiência do sistema de saúde são importantes, mas não suficientes já que a boa vida atinge máis do que o ben-estar pois é baseada na liberdade. Viver juntos é, por definição, aceitarmos a possibilidade de contagiarmos. Arriscar-se em todos os sentidos: a própria noção de vacina é baseada no de infeção, na inoculação de antígeno que estimulan os anticorpos capazes de gerar uma resposta imune. Um antígeno é geralmente uma molécula estranha ou tóxica para o corpo: aquilo que cria oposição. As vacinas geralmente são muito eficazes e, em alguns casos, conseguem erradicar a doença infecciosa que previr. Como qualquer outro medicamento, a sua eficácia e segurança não são absolutas, e sua administração às vezes é acompanhada de efeitos adversos malia ter um perfil de segurança  muito alto, acima da média dos meios terapêuticos utilizados na medicina atual. Porém, amiúdo esquecemos que os alicerzes da saúde pública são, juntas, vacinas e potabilização de auga, a intervenção mais eficaz conhecida , melhorando a qualidade e a expectativa de vida das pessoas. Enquanto lavamos obsessivamente as mãos e esperamos um bom suprimento de medicamentos e vacinas eficazes, a indiferença à falta de água potável em muitas partes do mundo está enraizada, se assim posso dizer, na ideologia do narcisismo de opulência,  apesar de ser uma das causas mais comuns de mortalidade.Quando a epidemia se espalhar para países como Peru, Bangladesh ou Congo. É provável que o maior número de mortes ocorra nesses países, não na Europa ou nos Estados Unidos.

Estamos vivendo uma pandemia global, que é sem dúvida uma situação arriscada, mas em tempos de urgência precisamos ser sérios, otimizando o potencial e protegendo adequadamente os recursos públicos disponíveis. Que significa isso? Que a sociedade não é um hospital nem  o confinamento é adiamento nem postergação. Que a vida é nomeada nas metamorfoses perpétuas das primeiras células, que os vírus começam com as primeiras células que abrigam o que  um dia se tornaram  quen  isto escreve e seu leitor. Por mais que saia da nossa alma dizer: maldito vírus! que calamidade e que desgraça! (do latim virus, “veneno” ou “toxina”). Aquí como en outros eidos, amaldiçoamos o que não comprendemos e angústia. Nem bom nem ruim, dificilmente uma força na ação que busca a vida e a auto-expansão. Agás o home, o depredador dos depredadores, estima-se que haja 1031 vírus e com capacidade de movimento entre diferentes biomas( 200.000 tipos diferentes de vírus circulam nos oceanos do mundo), a maioria dos quais são fagos que infectam bactérias. Estudos sugerem que a diversidade viral pode ser alta em escala local, mas relativamente limitada globalmente. Além disso, ao se mover entre ambientes, os vírus podem facilitar a transferência horizontal de genes. Estruturas simples, se comparados a células considerados parasitas intracelulares obrigatórios característica que para alguns cientistas  os impede de serem considerados seres vivos  ainda que representam a maior diversidade biológica do planeta.Porém, dependem do maquinário metabólico da célula hospedeira, mas até aí todos os seres vivos dependem de interações com outros seres vivos. Seja como for, sua origem é  aparentemente tão antiga como a própria vida.Memória do planeta. Talvez devêssemos esquecer tanta mecanicismo materialista e fitarmos que a vontade de poder age aquén e além nós. Portanto,  a mesma vontade de poder nietzscheana, anterior a toda vida, que insta a  sairmos o mais axinha possível, se não queremos que o remédio seja pior que a doença.

Se reconhecemos criticamente o valor da epidemiologia e das técnicas aplicadas de control de doenças, não devemos fazê-lo da maneira rigidamente hegeliana, como se fosse o último capítulo da história (o racional não é o real e o real não é o racional). Devemos insistir em uma distinção: dar cumprimento a uma visão ou teoria não implica de maneira alguma sua realização prática completa; ao contrário, de tempos em tempos, até que as coisas mudem, deve ser feita uma constante tradução crítica da teoria em sua manifestação tecnológica, que se transformou em um folclore sagrado do poder estatal-empresarial, para o qual os indivíduos somos tentados e para o qual o individuo-cliente pode direcionar o olhar com a mesma tranquilidade que um crente confia em uma pulsão imitativa confortável no âmbito de um imperial Estado-Sart-up .Que o temporário se torne conformarmos com levar no peto un documento de boa conduta que permita ao Estado classificar os cidadãos sob o novo regime de discurso e  de poder geolocalizador relacional.

Isso significaria que a imunização alcançada não é apenas para o vírus, mas para a possibilidade de uma criança e educação humana que seja mais do que apenas um jogo de rendimento que pode acabar sendo também o de total rendição ao imperativo neoliberal de auto-exploração. Que o imperativo sanitario de confinamento como teletrabalho ou como desemprego (ambas as duas fases do tempo de trabalho) direcionado ao bem comum da saúde se torne definitivamente num tempo de coerção em que o bem comum acabe sendo visto e aceito  como domesticação num ben-estar sem liberdade.

Aqueles que acham isso exagerado devem lembrar que alcançamos um sistema de educação e auto-educação continuada que nem os sindicatos questionam sobre um mundo adequado para um global de smart mobs que mal percebemos como disciplinares. Há sete anos, Byung-Chul Han traçou o paralelismo entre comunicação digital e vírus, “infecciossa porque ocorre imediatamente no nível emocional … o que não dá nada para ler ou pensar”. Escassa en significância e sentido, espalha pela rede como uma pandemia em comparação com a lentidão exigida por eidos como a leitura ou a escrita. A possibilidade de definitiva postergação da intimidade fronte o pulo da sociedade da transparência e sua  identificação com uma instituição total deve ser importante, acima de tudo, para mostrar como essas situações extremas nos convidam a conceber o sujeito humano como subjetivação do corpo e esse corpo definido a priori como humanizabel além de toda redução para a entidade biológica.

Até agora, neste século, a pandemia pela COVID-19 já é a segunda oportunidade de pôr os pés na dúvida, na suspeita e na decisão criativa de acontecimentos e obertura de horizontes especialmente agora, quando nos é prometida saúde por confinamento, devemos viver o tempo de uma maneira diferente, mesmo agora, especialmente agora.

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