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Cedeira, Contos, Fotografía — 24 Maio, 2020 at 9:46 a.m.

Ônibus

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Nos meados dos anos 70. Os ônibus do Baturro ancorados como  lanchas nas margens do rio Condominhas. Na altura, baixaram os nenos e nenas das paróquias para juntar-se á nova escola unitária “Nicolás del Rio” levantada nos marouçós. Outros, os mais grandes, ficaram nos Escolares Velhos, na Sindical e no Pósito, os vinculeiros que agora andam polos 60 e só ian fazer gimnasia ao pátio de columnas do novíssimo escolar.

Ainda não meio século depois, o campeiro é hoje a Praça Roxa -ainda seu nome patrucial é o de Sagrado Coração pela cor do pavimento e não pelo órgão cónico, algo aplanado, dos afectos marxistas, para alguns também da memória. Como na ficção borgeana,  as ruínas de outro templo, inçado de deuses incendiados e mortos; pegadas de pés descalços de baixar tarrafa e das cadernas inconsoláveis duma lancha procurando alguma contradição razoável. Uma praia que estava começando a ser devorada por pás selvagens que a febre do desenvolvimento profanou, para localizar um novo culto dos homens onde a areia incessante não circula mais. No areal eslaquiçado pronto a sumir, porque a nossa obrigação imediata era o sonho, íamos caçar grilos e a esfolar joelhos e calças de domingo. Em vez de ir á missa escapuliamos do adro sacerdotal para fedelhar patejos no rio ou jogar bola naquele outro adro ribanceiro onde tecer sonhos de areia nos intermináveis ​​dias de verão.

O da foto é um dia ao enxuito, um anaco de mundo invisível, antes de nos infundir o esquecimento total dos anos de aprendizagem. Talvez setembro, ao início no novo curso na vasta escola ilusória, porque o habitual durante o ano letivo eram os dias de invernia em que calçados com elásticas katiuskas choutavamos como sabíamos a passagem estreita de água nas poças para logo passarmos a manhã enchoupados na classe até a lentura se confundir paseninho com os corpos viçosos, as frieiras e o salgadio do mar sempre presente. Mas hoje não chove e os ônibus estacionam na areia sem medo a embarrar no xabre.

Ou talvez sejam ônibus de romeiros de volta de Teixido, que alcançaram meu horizonte com seu passado, com suas voltas e reviravoltas numa pátria de infinitas aldeias por toda parte desaparecidas, no flanco desenvolvimentista do rio, onde a língua  de  Apana Celtica contaminada com latim,  onde já não é  incomum ver gente na Praça Roxa a perguntar pelo seu próprio nome. 

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